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A tensão entre Venezuela e Guiana pode escalar para um conflito armado?


Reprodução

Um referendo realizado na Venezuela no domingo (3) indicou que quase 96% da população é a favor da anexação da região de Essequibo, que corresponde a mais da metade do território da vizinha Guiana. A situação está muito tensa entre Venezuela e Guiana, mas um conflito armado só aconteceria em última instância. O coordenador do Curso de Relações Internacionais do Ibmec, Adriano Gianturco, explica que ainda não é possível afirmar se os venezuelanos vão investir em uma ação militar para anexar o território rico em petróleo, embora a pauta da anexação do território tenha grande aderência entre a população.
"Como se dá uma anexação? Acontece com a ocupação de território. Pode ser feita por parte do Estado, com as Forças Armadas, ou por uma colonização, com parte dos venezuelanos incentivada a morar na região. A possibilidade de uma invasão armada existe ao ver a diferença entre os dois países. A Venezuela é um país grande, populoso, enquanto a Guiana é uma pequena nação com 800 mil moradores", explica o professor Gianturco. Segundo ele, o desequilíbrio de poder pode fazer com que a Venezuela se arrisque em uma empreitada militar.
"Quando há equilíbrio de poder entre dois países, o conflito armado é mais improvável, os dois lados temem um custo muito grande. Mas quando há diferença nas forças, o país mais forte se sente mais estimulado", afirma Gianturco. Além das forças armadas, a Venezuela conta com grupos paramilitares e de milicianos mercenários. Caso a situação escale para uma ação armada, a Venezuela poderá sofrer uma grande repreensão internacional - a Corte Internacional de Justiça decidiu nesta sexta-feira (1º) que a Venezuela não pode tentar anexar Essequibo. O professor de Direito Internacional da UFMG, Lucas Carlos Lima, não acredita que a instabilidade na região de Essequibo evolua para um conflito armado.
"A verdade é que o futuro dessa controvérsia depende muito do processo que ocorre na Haia. Ademais, nenhum Estado da região está interessado num conflito, que possui uma longa tradição de soluções pacíficas. Conflitos armados criam instabilidade para transações comerciais, para a estabilidade política e para as populações envolvidas", argumenta Lucas Carlos Lima. A disputa pela região de Essequibo acontece desde o século XIX. Em 1899, houve um laudo feito por um grupo de árbitros internacionais em que foram estabelecidas as fronteiras atuais. Décadas depois, em 1966, foi firmado o Acordo de Genebra entre Venezuela e Reino Unido, em que Caracas deixou claro considerar fraudulento o laudo arbitral anterior. Neste momento, fica oficializado o impasse sobre a região. De acordo com Lucas Carlos Lima, a área é disputada porque foram colonizadas por potências diferentes: a região da Venezuela pela Coroa Espanhola, e a região da Guiana pela Coroa Britânica. "A solução se deu em 1899 com uma arbitragem que decidiu as fronteiras entre os dois Estados. Contudo, a Venezuela começou a contestar essa arbitragem, alegando a corrupção dos árbitros, que teriam favorecido a Guiana. Hoje, sabemos que a região do Essequibo é uma região rica de recursos, e que dá direito também à recursos marinhos, como petróleo. Assim, a disputa se reacendeu nos anos 60 e somente nos anos 2000 foi parar na Corte Internacional de Justiça", explica.
A reivindicação da Venezuela junto à Corte se intensificou desde que a multinacional norte-americana ExxonMobil descobriu, em 2015, petróleo em águas disputadas - o que deixa a Guiana com reservas de petróleo comparáveis às do Kuwait e com as maiores reservas per capita do mundo. Mas a movimentação da Venezuela não se dá apenas pelos recursos naturais da região amazônica de Essequibo. Deve-se lembrar que o país vive uma tensão política nos últimos anos, em que de uma lado está o governo autoritário de Nicolás Maduro e de outro uma oposição que não consegue participar de forma igualitária das eleições.
"A Venezuela está passando por vários problemas e vai ter uma eleição muito complicada. Tratar de Essequibo é uma forma de distração das massas, como muitos outros governos fizeram no passado. Como o caso das Falklands (Ilhas Malvinas), que foi uma investida da Argentina durante um período de ditadura militar e crise econômica", diz Gianturco. A Guerra das Malvinas aconteceu em 1982 e terminou com a decisão de que o arquipélago ficaria com o Reino Unido.
Com a criação de um inimigo comum, fica mais fácil unir a população e ter adesão às ações governamentais. O referendo pode ser uma estratégia para engajar os habitantes do país. "Esse é um efeito chamado 'Rally 'round the flag', ou seja, todo mundo se une ao redor da bandeira", completa Gianturco. Lucas Carlos Lima lembra que, enquanto a Venezuela utiliza o discurso com fins políticos, a Guiana segue pelo caminho de recorrer a um tribunal internacional para reconhecer como válido o laudo arbitral que delimitou as fronteiras em 1899.
"Ademais, caso a Venezuela esteja ameaçando de usar a força, ela pode recorrer a organismos internacionais como a Organização dos Estados Americanos ou ainda ao Conselho de Segurança da ONU, que é responsável pela manutenção da paz e seguranças internacionais. A decisão obrigatória que a Corte Internacional de Justiça emitiu na sexta-feira já é uma garantia de que a Venezuela não deve tomar ações que irão agravar a disputa".
Fonte: O Tempo

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